Indústria de biodiesel e soja do Brasil crê na reversão de mistura menor, cita estoques

1 de dezembro de 2021 - por Reuters


Por Roberto Samora e Ana Mano

SÃO PAULO (Reuters) – A indústria de biodiesel e da soja do Brasil ainda não se rendeu a uma decisão governamental desta semana que estabelece uma mistura menor de 10% do produto no diesel para todo o ano de 2022, e acredita em uma reversão da medida assim que o presidente Jair Bolsonaro tiver todas as informações sobre os custos e prejuízos.

E esses setores avaliam que não estão sozinhos neste movimento. Além do poderoso lobby da indústria de soja, principal item do agronegócio brasileiro e também matéria-prima de cerca de 75% do biocombustível, a indústria de biodiesel acredita ter o apoio de processadores de carnes, consumidores de farelo de soja, ingrediente importante da ração animal.

A ideia é que o governo volte atrás e reverta a mistura para os 13% de biodiesel no diesel que deveriam ter vigorado na maior parte do ano, o que não ocorreu por uma decisão governamental devido custos mais altos da matéria-prima. Para 2022, contudo, o segmento acredita que estoques maiores após safras recordes vão trazer alívio para o mercado.

“A Frente Parlamentar do Biodiesel vai atuar, tão logo o presidente da República saiba da repercussão, certamente deverá mudar a posição”, disse Francisco Turra, presidente do Conselho de Administração da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio).

Turra, ex-ministro da Agricultura e ex-presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), que representa produtores de aves e suínos, comentou que a decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), integrado por vários ministérios, seguiu uma posição da área econômica do governo. Mas que os temores com custos não se justificam, e isso deverá ser esclarecido em breve, acrescentou.

Ao contrário, os impactos para a economia podem ser mais danosos se o B10 for mantido. Ele disse que o setor se preparou para uma mistura de 14% de biodiesel em março do ano que vem, conforme resolução anterior do governo.

“Há um prejuízo enorme dos investimentos feitos e dos empregos que seriam gerados, sem falar dos gastos com importação de diesel, estamos gastando bilhões de dólares em diesel fóssil quando poderíamos ter o emprego verde”, comentou.

Para Aprosoja Brasil, que representa os sojicultores, “a redução da demanda por óleo de soja pode, sim, prejudicar o setor e afetar negativamente os preços”.

Dessa forma, a Aprosoja disse em nota nesta quarta-feira que “espera que a decisão seja revertida o mais rapidamente possível, retomando-se imediatamente o B13 e a progressividade até o B15 conforme o que está previsto na Resolução CNPE 16/2018” –o B15 está previsto para 2023.

Segundo dados do setor, com a redução do percentual para 10%, a agroindústria brasileira de soja deixará de processar em 2022 cerca de 6 milhões de toneladas dessa oleaginosa, restando exportar o produto in natura –o que indica que a redução da mistura não tem impacto na oferta de óleo de soja.

Além disso, o Brasil também deixará de gerar 1,2 milhão de toneladas de óleo e 4,8 milhões de toneladas de farelo, conforme citação de dados de outra entidade do setor, a Abiove, que projeta estoque finais em 2021 avançando para 5,8 milhões de toneladas da oleaginosa, o dobro do início da última temporada. As reservas devem aumentar mais até o final de 2022, com a confirmação de nova safra recorde.

“Com a redução no esmagamento, tem uma pressão nos preços dos insumos, e termina ocasionando elevação de preços, como aconteceu com o milho (pela quebra de safra), teve de importar milho, o preço do frango subiu”, disse Turra.

“Se tem mais disponibilidade, sobra farelo para exportar… e sobra farelo para o mercado interno em abundância, e não há pressão nos preços”, disse Turra, lembrando que as exportações de carnes de aves e suínos estão crescendo dois dígitos.

Em nota, a associação que representa a indústria de frango e suínos ABPA apontou “grande preocupação” com a potencial redução da oferta de farelo de soja, devido à decisão de reduzir a mistura de biodiesel.

“Menor oferta do produto poderá significar em alta de preços, gerando perda de competitividade e inflação ainda maior para o consumidor, em meio ao momento de maior alta de custos de insumos da história da avicultura e da suinocultura do Brasil”, afirmou a entidade.

A ABPA ressaltou ainda que o farelo de soja já acumula mais de 60% de elevação nos preços praticados ao longo deste ano, em relação ao mesmo período de 2020.

Sobre argumento de que o biodiesel aumenta custos do diesel, dados de outra entidade, a Ubrabio, apontam que impacto foi “insignificante”, de 0,1 ponto percentual, na formação de preço final do diesel vendido ao consumidor, entre janeiro e outubro.

Turra disse ainda que há muitas “forças antagônicas” interessadas no tema. “Para muitos é vantajoso continuar importando diesel fóssil”, declarou, sem especificar.

Para além da questão dos custos, integrantes do setor de combustíveis e mesmo entidades que representam consumidores têm afirmado que o aumento da mistura gera problemas de qualidade para o diesel vendido nos postos, o que a indústria de biodiesel não concorda.

A Confederação Nacional do Transporte (CNT) e a associação que representa as montadoras de veículos, a Anfavea, defenderam em outubro, em audiência no Senado, que a mistura de biodiesel fosse fixada em 10%, citando que níveis acima desse índice geram problemas para os motores.

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