A romantização da pobreza brasileira

A romantização da pobreza tem se tornado cada vez mais comum e normal. Quando, na verdade, deveríamos combate-lá! Entenda por quê.

7 de novembro de 2024 - por Raul Sena (Investidor Sardinha)


Estou cansado da romantização da pobreza no Brasil. Recentemente, vi uma reportagem em um jornal local sobre um senhor de 64 anos que acordava às 5h da manhã para fazer sanduíches e vendê-los no terminal de ônibus. O apresentador exaltava a dedicação desse senhor como se o que ele fazia fosse algo inspirador. Mas a verdade é que, a essa altura da vida, ele deveria estar aposentado.

A matéria ainda mencionava que, ao fim do dia, ele doava os sanduíches que sobravam para moradores de rua, como se fosse um gesto admirável, e não um reflexo doloroso da situação em que ele e tantas outras pessoas se encontram. Essa cena é uma prova gritante de que nosso país falhou com ele.

Chegamos a um ponto em que aplaudimos a resiliência de um senhor que, aos 64 anos, sai de casa antes do amanhecer para vender pão e ainda divide o pouco que sobra com quem precisa. E tudo isso em um país que se orgulha de ser a nona maior economia do mundo, mas onde o sistema não garante uma aposentadoria digna nem o básico para a população mais carente.

Isso não é motivo de celebração; estamos, na verdade, naturalizando a miséria. Em vez de resolvermos o problema, estamos tratando-o como algo bonito e admirável. Precisamos olhar para essa situação com a seriedade que ela merece.

Porque o brasileiro parou de empreender?

Os brasileiros estão desistindo de empreender, e a razão para isso faz sentido.

A primeira barreira é abrir um CNPJ, que já vem com uma cobrança mensal de impostos. Imagine alguém que vende cachorro-quente para sobreviver: precisa desembolsar cerca de R$70 todo mês. Ao ano, isso dá R$840 – mais da metade de um salário mínimo. É um valor que poderia ser reinvestido no próprio negócio, ou até mesmo em um simples lazer com a família.

Agora, suponha que esse empreendedor conseguiu crescer, ultrapassou o Simples Nacional e o limite de R$144 mil de faturamento anual. Mesmo que esse valor seja de faturamento bruto, e não de lucro, ele passa para uma nova faixa de impostos, que vai de 4% a 33%. No caso de prestadores de serviço, a tabela começa com 6% do faturamento.

É difícil ver como o país se beneficia ao cobrar impostos tão altos de pequenos negócios que podem gerar empregos e contribuir com o crescimento econômico. Além disso, esses empreendedores já estão pagando impostos sobre insumos, maquinários e outros custos.

O sistema ainda impõe uma série de outras burocracias para poder operar e contratar. Quando chega o momento de contratar, é outro conjunto de tributos e exigências legais.

Enquanto isso, empresas grandes, que apoiam políticos e têm influência, recebem incentivos e isenções. Esse cenário acaba punindo o pequeno empreendedor, que precisa arcar com o dobro do custo para ter alguém trabalhando ao seu lado.

A pobreza no Brasil não vai melhorar?

No Brasil, parece não haver oportunidades reais para um cidadão médio sair de seu bairro e abrir um negócio. Enquanto isso, muitos ficam na esperança de que uma grande empresa chegue para contratar todo mundo. Mas, na realidade, esse cenário é improvável.

Hoje, 6 em cada 10 empregos no Brasil são gerados por micro e pequenas empresas. Se o brasileiro tivesse acesso a linhas de crédito mais acessíveis, a situação poderia ser outra. Nos EUA, por exemplo, o empreendedorismo é muito mais simples. Não há burocracia para começar a vender; para contratar alguém, é possível pagar por hora e, caso o negócio enfrente dificuldades, a demissão não vem acompanhada de encargos trabalhistas. Isso facilita o desenvolvimento de pequenos negócios.

Para realmente salvar o país, precisamos de empregos de qualidade e de um ambiente favorável para fundar e manter uma empresa. Mas, em vez disso, romantizamos a pobreza e o esforço extremo dos brasileiros para sobreviver.

Com 193 países no planeta, o Brasil está entre os que mais circulam dinheiro, ocupando a 9ª posição. Se, mesmo assim, não conseguimos resolver esses problemas agora, quando vamos conseguir? É uma situação que, na prática, se mostra quase impossível de resolver, e os líderes sabem disso. Enquanto a pobreza existir, sempre haverá uma plataforma para manter o processo de dependência e dificuldades da população.

Nos últimos 30 anos, as maiores mudanças que tivemos certamente vieram do setor privado. O estado só poderá realmente auxiliar a população quando houver uma saída para a pobreza. Hoje, no entanto, temos apenas portas de entrada para a pobreza, e a realidade da luta do brasileiro ainda é constantemente romantizada.

Educação financeira nas escolas?

Fala-se muito sobre a necessidade de ensinar educação financeira nas escolas. E, para ilustrar o quanto esse tema pode ser contraditório, vou contar um exemplo real.

Um político nos procurou para desenvolver um programa de educação financeira para escolas públicas, e nós concordamos. Nossa única condição era não envolver dinheiro: não queríamos participar de licitação, nem receber verba pública. Resultado? Ele sumiu. Provavelmente, a ideia era que ganhássemos a licitação e repassássemos uma parte do valor para ele. Quando a proposta é resolver de verdade, parece que o interesse desaparece.

É desanimador e revoltante. E, quando se tenta mostrar que é possível romper com essa realidade, logo vêm exemplos de pessoas que saíram da pobreza e conseguiram ‘chegar lá’, sugerindo que todos teriam a mesma chance. Mas a realidade é bem diferente. Essas histórias de superação, na verdade, são casos isolados, que ocorrem apesar de todas as dificuldades. São mais resultado de circunstâncias excepcionais ou até sorte, e não de um sistema que realmente ofereça as mesmas oportunidades para todos.

Romantização da pobreza

Romantizar a pobreza não leva a lugar algum; pelo contrário, só ajuda a perpetuar a situação em que estamos. Precisamos encontrar uma forma de exigir que nossos políticos trabalhem para nos tirar desse cenário. Atualmente, não vejo perspectivas de melhora. E, pior, a pobreza está sendo cada vez mais romantizada.

Isso não é bonito, não é aceitável, e é profundamente desanimador. Precisamos desburocratizar o Estado e valorizar quem trabalha de verdade. Quer entender mais sobre esse desabafo? Assista ao vídeo completo!

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