Viés cognitivo: o que é, tipos, impactos

O viés cognitivo é um erro recorrente que o cérebro humano comete ao se basear em pré-julgamentos nas tomadas de decisões. Leia mais.

27 de maio de 2021 - por Jaíne Jehniffer


Já percebeu como, às vezes, a mente toma decisões quase no automático, e só depois surge aquela sensação de “opa, por que fiz isso?” Pois é exatamente aí que entram os vieses cognitivos. Eles são como pequenos atalhos mentais que o cérebro usa para economizar tempo e energia, mas que, de vez em quando, acabam nos levando a conclusões tortas, digamos assim.

Quer entender por que isso acontece e como esses vieses moldam tantas decisões sem que percebamos? Neste texto, a gente te explica tudo. Vamos lá?

O que é viés cognitivo?

Imagine que sua mente funciona como alguém que precisa tomar centenas de decisões por dia. Para dar conta de tudo, o cérebro cria pequenas rotas rápidas de pensamento: atalhos que ajudam a interpretar o mundo sem gastar energia demais. É aí que entram os vieses cognitivos.

Em termos simples, um viés cognitivo é um tipo de pré-julgamento automático que influencia a forma como percebemos e analisamos as informações ao nosso redor.

Não se trata de uma “falha” ocasional, como quando erramos algo por pura falta de conhecimento. Na verdade, estamos falando de erros lógicos sistemáticos, que se repetem mesmo quando já sabemos que eles existem.

Isso ocorre porque os vieses fazem parte da maneira como o cérebro foi moldado ao longo da evolução. Diferente dos erros causados por ignorância, que tendem a desaparecer quando aprendemos algo novo, os vieses permanecem.

Eles reaparecem, insistem, atravessam as nossas decisões, mesmo quando estamos conscientes deles. É quase como se fossem programas internos que vêm instalados de fábrica.

E por que o cérebro age assim? Porque pensar dá trabalho. Literalmente. O órgão que cabe na nossa cabeça consome algo entre 20% e 30% de todas as calorias que ingerimos.

Hoje isso parece pouco preocupante, já que a maioria das pessoas tem fácil acesso à comida. Mas, se olharmos para a nossa história, veremos que essa nunca foi a realidade.

Durante grande parte da evolução humana, viver significava economizar cada gota de energia: caçar, fugir de predadores, sobreviver ao frio, encontrar abrigo.

Nesse ambiente imprevisível, decisões rápidas eram mais importantes do que decisões perfeitas. Assim, nosso cérebro aprendeu a priorizar a agilidade em vez da precisão, um mecanismo que foi extremamente útil na era das cavernas e que, de certo modo, ainda guia algumas das nossas escolhas hoje.

Por isso ele tende a simplificar certas situações, preferindo recorrer a esses atalhos mentais pré-programados, mesmo quando seria melhor analisar tudo com um pouco mais de calma.

Causas do viés cognitivo

Quando tentamos entender por que nossa mente insiste em “puxar” esses atalhos, vale olhar com carinho para os fatores que alimentam os vieses cognitivos. Eles não surgem do nada; na verdade, são resultado de vários mecanismos naturais do nosso próprio funcionamento mental.

Um dos principais é o uso das heurísticas. Pense nelas como caminhos mais curtos que o cérebro cria para dar conta de tantas decisões ao longo do dia. Esses atalhos, embora práticos, também podem nos levar a conclusões rápidas demais, e é justamente aí que nascem erros sistemáticos.

Outro ponto importante é a capacidade limitada de processamento. Nossa mente não consegue analisar tudo profundamente o tempo todo. A memória falha, a atenção dispersa, os detalhes escapam, e, nesse cenário, algumas interpretações acabam ficando incompletas ou distorcidas, mesmo sem intenção.

As emoções também entram forte nessa equação. Muitas vezes, julgamos situações não com base em fatos, mas naquilo que queremos sentir.

A necessidade de proteger nossa autoestima, evitar conflitos internos, como a famosa dissonância cognitiva, ou até o simples medo de perder algo fazem com que a mente escolha versões mais “confortáveis” da realidade.

A isso se soma a influência social. Somos seres relacionais, e o desejo de pertencer a um grupo ou evitar julgamentos pode moldar nossa forma de pensar. Às vezes, acabamos ajustando opiniões só para acompanhar a maioria, mesmo sem perceber.

E, para completar, existe ainda o fator das distorções de memória. Nossa lembrança não funciona como uma gravação perfeita: ela muda, se adapta, perde partes, acrescenta outras.

Assim, quando recuperamos uma memória para tomar uma decisão, ela pode vir carregada de pequenas falhas que afetam nosso julgamento.

Como saber se você tem algum viés cognitivo?

Reconhecer um viés cognitivo em ação não é tão simples quanto parece. Afinal, ele funciona de maneira automática.

Mas a parte boa, digamos assim, é que existem alguns sinais que podem ajudar você a perceber quando a mente está tentando “encurtar o caminho”.

Um deles é a inflexibilidade. Quando você percebe que está preso a uma opinião e não se abre para outras possibilidades, mesmo diante de argumentos bem fundamentados, vale acender um alerta.

Muitas vezes, essa rigidez não vem de uma análise profunda, mas de um viés tentando proteger uma crença já instalada.

Outro indício é quando você ignora ou minimiza informações que contradizem seu ponto de vista. É aquele momento em que você pensa: “Isso não deve ser bem assim…”, mas, na verdade, só não quer lidar com a ideia de que pode estar enganado.

Há também a tendência de justificar decisões depois que elas já foram tomadas, quase como se você estivesse montando uma defesa interna para explicar por que escolheu determinado caminho.

Esse movimento é comum quando o cérebro tenta encaixar a decisão em uma narrativa que faça sentido, mesmo que a escolha tenha sido impulsiva ou emocional.

Prestar atenção apenas às informações que confirmam o que você já acredita também é um comportamento típico. Você foca no que reforça sua visão de mundo e, sem perceber, afasta dados que poderiam ampliar sua compreensão da situação.

E, claro, não dá para esquecer das reações emocionais. Se você sente defensividade, raiva, irritação ou ansiedade sempre que alguém apresenta uma perspectiva oposta, é bem possível que algum viés esteja puxando as cordas por trás do palco.

Quais são os principais tipos de viés cognitivo?

1- Viés de Ancoragem

O viés de ancoragem acontece quando usamos a primeira informação recebida como ponto de referência para julgar todo o resto. É como se essa “âncora inicial” moldasse nossas escolhas, mesmo quando não faz muito sentido.

Você já percebeu como o primeiro preço que vemos de um produto influencia se consideramos o restante caro ou barato? Esse é o viés funcionando.

2- Viés de Disponibilidade

Aqui, o cérebro decide com base naquilo que vem mais facilmente à mente. Em vez de analisar dados reais, ele se apoia em lembranças recentes ou marcantes.

Se você acabou de ver uma notícia sobre acidentes de avião, por exemplo, pode superestimar o risco de voar, não porque o perigo aumentou, mas porque a informação ficou mais “acessível” na memória.

3- Viés de Confirmação

Esse viés nos leva a procurar, lembrar e valorizar apenas aquilo que confirma o que já acreditamos. É como se a mente funcionasse com um filtro automático que deixa passar o que apoia a nossa visão de mundo, enquanto ignora ou minimiza o que a contradiz.

Por isso ele é tão presente em debates, redes sociais e até na forma como pesquisamos algo no Google.

4- Viés de Afinidade ou Semelhança

O cérebro tende a favorecer pessoas que se parecem conosco, seja na aparência, nos gostos ou na história de vida.

Essa inclinação cria uma sensação automática de simpatia e confiança, ainda que não haja motivo lógico para isso. É um viés muito observado em entrevistas de emprego, decisões de liderança e dinâmicas de grupo.

5- Viés de Autoridade

Quando alguém com status, título ou posição de poder faz uma afirmação, tendemos a aceitar essa informação sem questionar.

Esse viés faz com que a opinião de figuras de autoridade pareça automaticamente mais confiável, mesmo que não seja. É o motivo de tantas pessoas seguirem recomendações apenas porque “foi um especialista que disse”.

6- Efeito Halo

O efeito Halo ocorre quando uma característica positiva de alguém, como simpatia, beleza, competência, acaba “iluminando” todo o resto, levando-nos a imaginar outras qualidades que a pessoa talvez nem tenha.

Esse brilho inicial influencia nossa avaliação global e pode fazer com que superestimemos capacidades ou intenções.

7- Efeito Chifre

É o oposto do efeito Halo. Aqui, uma característica negativa domina nossa percepção e nos leva a enxergar a pessoa de forma distorcida, acreditando que outros aspectos dela também são ruins.

Um erro pontual, uma atitude impaciente ou até um detalhe estético podem desencadear essa visão desfavorável.

8- Efeito Dunning-Kruger

Esse efeito descreve a tendência de pessoas com pouco conhecimento sobre um assunto superestimarem sua própria habilidade. Já indivíduos realmente competentes tendem a duvidar mais das próprias capacidades.

É como se a falta de domínio impedisse alguém de perceber suas limitações, e o excesso de domínio fizesse o especialista enxergar nuances demais.

9- Efeito Bandwagon

Conhecido como “efeito manada”, ele aparece quando adotamos uma opinião ou comportamento simplesmente porque muita gente está fazendo o mesmo. A sensação de pertencimento e validação social fala mais alto, e o pensamento crítico acaba ficando em segundo plano.

É muito comum em modas, bolhas financeiras e debates polarizados.

Exemplos de viés cognitivo

Um deles é o viés de ancoragem. Imagine que você está pesquisando o preço de um produto e o primeiro valor que encontra é muito alto.

Mesmo que, depois, apareçam outras opções mais baratas, aquela primeira informação já cria uma espécie de “ponto de referência” na sua mente.

É como se o cérebro pensasse: “Tudo deve girar em torno desse número”. A partir daí, qualquer decisão passa a ser influenciada por essa âncora inicial, mesmo que ela não seja a mais relevante.

Outro exemplo é o viés de confirmação. Ele aparece quando buscamos informações que reforçam aquilo que já acreditamos e descartamos aquilo que desafia nossas ideias.

É quase um mecanismo de autoproteção emocional: preferimos aquilo que nos deixa confortáveis. O problema é que, ao fazer isso, deixamos de enxergar o quadro completo e acabamos presos em versões limitadas da realidade.

Impactos do viés congnitivo

A gente já pode perceber, até aqui, que os vieses cognitivos não ficam apenas no campo teórico. Eles aparecem no nosso dia a dia, influenciando decisões grandes e pequenas.

Como funcionam de maneira automática, acabam criando erros sistemáticos de julgamento que distorcem a forma como percebemos a realidade. Às vezes, achamos que estamos sendo totalmente racionais, mas a mente já filtrou, editou e reorganizou as informações antes mesmo de percebermos.

Um dos exemplos mais conhecidos é o viés de confirmação. Ele faz com que a gente dê mais atenção às informações que reforçam aquilo em que já acreditamos e, ao mesmo tempo, ignore ou desvalorize dados que contradizem essas crenças.

É como se o cérebro dissesse: “Vamos focar no que me deixa confortável?”. Esse mecanismo cria bolhas de percepção e dificulta análises mais equilibradas.

Outro impacto aparece no chamado viés de controlabilidade. Aqui, tendemos a acreditar que temos mais controle sobre certas situações do que realmente temos.

Esse excesso de confiança pode levar a decisões arriscadas, apostas equivocadas e interpretações erradas sobre o que depende, ou não, de nós.

Para finalizar, há também a tendência ao status quo, que nada mais é do que aquela resistência quase instintiva a mudanças. Mesmo quando uma alternativa pode ser melhor, o cérebro prefere o caminho conhecido, porque ele exige menos esforço e gera menos ansiedade.

Assim, acabamos mantendo hábitos, escolhas e até opiniões simplesmente porque parecem “mais seguras”.

Como evitar o viés cognitivo?

Se você já tentou “domar” seus vieses cognitivos, talvez tenha percebido que essa é uma tarefa quase impossível. E tudo bem, já que eles fazem parte do nosso funcionamento natural.

Mas isso não significa que estamos completamente à mercê deles. Existem maneiras de reduzir seu impacto, e o primeiro passo é justamente reconhecer que eles existem. Concorda?

Conhecer os vieses mais comuns é como acender a luz de um quarto escuro: de repente, aquilo que antes passava despercebido começa a se tornar visível.

Quando entendemos como esses atalhos mentais operam, fica mais fácil perceber quando eles querem influenciar nossas escolhas.

Às vezes, porém, a gente sabe, o cérebro é tão convincente nas próprias narrativas que acabamos criando pequenas desculpas internas, quase como mentirinhas que contamos para nós mesmos, só para manter a sensação de que estamos no controle.

Outra estratégia poderosa é desenvolver o pensamento crítico. Isso significa questionar, refletir, pedir mais detalhes, buscar outros pontos de vista e, sempre que possível, apoiar decisões em argumentos e evidências. Funciona como um freio suave que impede que a mente dispare automaticamente na direção do atalho mais fácil.

Claro que existe um limite aí. Ninguém consegue ser completamente racional o tempo todo, e nem deveria.

Afinal, somos seres emocionais, com rotinas aceleradas e atenção limitada. Por isso, pensar de forma crítica não exige perfeição, mas sim disposição para observar os próprios pensamentos com um pouco mais de cuidado.

Como dominar e lidar com o viés cognitivo?

Lidar com os vieses cognitivos não é sobre tentar se transformar em uma máquina perfeitamente lógica. É mais sobre desenvolver um olhar atento para as próprias decisões, quase como se você se tornasse um observador do seu próprio processo mental.

Um bom começo é adotar um ritmo um pouco mais cuidadoso ao avaliar situações do dia a dia.

Antes de aceitar uma proposta, dar uma resposta rápida ou seguir o primeiro impulso, vale a pena se perguntar: “Será que não estou caindo em algum viés cognitivo aqui?”

Esse simples momento de pausa já abre espaço para escolhas mais conscientes.

Também ajuda muito aprender a reconhecer padrões internos. Aos poucos, você começa a notar que certos tipos de decisão sempre despertam as mesmas reações, seja a preferência pelo que parece mais familiar, seja a pressa de julgar algo sem olhar todos os lados.

Identificar essas repetições é como encontrar pegadas que revelam quando um viés está tentando assumir o volante.

E, claro, a lógica continua sendo uma aliada valiosa. Não aquela lógica rígida e distante, mas um raciocínio estruturado que te convida a comparar argumentos, buscar fatos, ouvir opiniões diferentes e questionar suas próprias conclusões.

Portanto, quanto mais você treina esse hábito, mais natural ele se torna.

Fonte: G4 Educação, FPPS, Bruno Ribeiro,

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